Para a editora da revista Margem Esquerda e da Boitempo Editorial, Ivana Jinkings, o processo envolvendo Emir Sader não é um caso isolado e indica que está em curso uma campanha contra toda a esquerda. Em entrevista à Carta Maior, ela rebate críticas e acusações publicadas na Folha de S.Paulo e comenta o número crescente de ataques a intelectuais de esquerda. "A campanha é contra toda a esquerda e o que representamos. Por isso devemos ficar alertas", defende Jinkings.
Carta Maior: A Sra. foi mencionada num artigo na Folha de S. Paulo, a propósito do processo do Senador Bornhausen contra o Professor Emir Sader. O que a sra. tem a dizer sobre isso?
Ivana Jinkings: O que o colunista fez contraria todas as regras do bom jornalismo, inclusive as do manual de redação do seu (dele) jornal. Nosso manifesto não é contra a ação movida pelo Bornhausen. É contra a sentença do juiz, que menciona prisão e perda de cargo de professor da UERJ. É a segunda vez, no espaço de uma semana, que esse jornalista se dedica ao assunto. Com virulência espantosa, ódio. Primeiro, tentando desqualificar Emir Sader como o intelectual "zero à esquerda". Usando o nome de um livro de um intelectual da esquerda, Paulo Arantes, e pretensamente defendendo outro intelectual da esquerda, Chico de Oliveira, o que os conservadores pretendem é fragmentar, sempre e cada vez mais, a esquerda. Não reconheço nesse obscuro jornalista credenciais ou idoneidade para julgar currículos e estatura intelectual de quem quer que seja. Mas é certo que temos projetos que nos distinguem. Eles usam tudo o que podem para atacar os que resistem, enquanto nós abrimos espaço para a conscientização popular, seguindo princípios historicamente construídos.Em sua coluna, ele mencionou meu nome e o da Boitempo, sem que qualquer repórter tenha se dado ao trabalho de me ouvir. Um jornal que se pretende sério não faria isso. O jornalista usou um espaço nobre, abusou da posição e do cargo que ocupa (autorizado por seu patrão, certamente) para publicar uma denúncia de surpresa. Faz graves e levianas acusações, assumindo uma versão como fato, tomando uma posição no processo que ainda não foi concluído. Isso é não apenas mau jornalismo, mas configura um crime, salvo engano.
CM: Como a sra. analisa a repercussão desse processo do senador Bornhausen contra o professor Emir na presente conjuntura, com um manifesto com mais de 15 mil assinaturas?
IJ: As milhares de assinaturas, vindas de todos os continentes, falam por si. O mencionado colunista escreve também que o manifesto que lançamos é "hipócrita". Não que os interesse, ou faça diferença: mas dissidentes cubanos não foram executados por se expressarem, mas por seqüestrarem um barco. Pena de morte é abominável, mas não apenas em Cuba, deveria ser também abominável nos Estados Unidos. Seriam então hipócritas os quase 20 mil que assinaram o manifesto, entre eles Antonio Candido, Luiz Fernando Verissimo, Chico Buarque, Eduardo Galeano, Frei Betto, Perry Anderson, István Mészáros, Roberto Schwarz, Chico de Oliveira (para quem, aliás, não fizemos um desagravo no caso Delúbio Soares pelo simples fato de que o Chico não foi condenado), Paulo Arantes, Oscar Niemeyer, Ferreira Gullar, Augusto Boal, Tom Zé, Fernando Morais e tantos mais? Quem vai nos ensinar a pensar a partir de agora é a Folha de S.Paulo, talvez numa dobradinha com sua musa inspiradora, a revista Veja?
CM: Faz algum tempo têm surgido várias manifestações na imprensa criticando os intelectuais, ora o que é interpretado como seu "silêncio", ora o que é criticado como uma forma de "adesismo" a-crítico à reeleição de Lula. Como a sra. analisa essa tendência?
IJ: Talvez essa cruzada - personificada agora no Emir - não seja especialmente contra ele, ou contra o manifesto em sua solidariedade. O que incomoda a direita e seus porta-vozes é perceber que ainda existimos nós, os que resistem. Veja o tratamento desrespeitoso e truculento dado a Saramago, no mesmo jornal. Veja como foram tratados recentemente Marilena Chauí e outros que ousaram defender o governo Lula. A campanha é contra toda a esquerda e o que representamos. Por isso devemos ficar alertas.
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