15.2.09

Ainda "O Leitor"

Stephen Daldry é diretor de “Billy Elliot”, de 2000, “As Horas”, de 2002 e de “O Leitor”, de 2008, mas que chegou ao Brasil neste ano. Os dois últimos são adaptações literárias – não sei se o primeiro também é.

“As Horas”, de 2002, é não apenas uma adaptação literária, mas também uma adaptação literal do livro de Michael Cunningham. O conceito de adaptação literal de uma obra a outra é incerto, mas, no momento, faz as funções que me interessam: assistir ao filme é uma passagem suave para aqueles que leram o livro.

Quando assisti ao filme “O Leitor”, algo me incomodou. Me senti como se o diretor tivesse optado por me “esconder” algo desta história: por que o protagonista se fecha tão solidamente? Por que ele decide, subitamente, se abrir? Por que há duas sobreviventes, como elas sobreviveram? Senti também como se o diretor, ao tratar o personagem de Hanna, tivesse tomado decisões, feito escolhas, em nosso nome, em nome do público, tirando do público a chance de um julgamento. Como?

Kate Winslet empresta uma potência única a qualquer personagem seu, das mulheres de Jane Austen à escritora Iris Murdoch, passando pela maluquinha de “Brilho eterno de uma mente sem lembrança”. Ela é conhecida por ser uma atriz mais “autêntica”, a menos hollywoodiana das hollywoodianas. Enfim, quando Kate Winslet é escolhida para fazer Hanna, esta potência, muito sedutora, nubla nossa visão, nubla nossa visão especialmente no momento de conhecer e reconhecer o dilema ético do personagem. No momento de julgá-la.

Hanna é apresentada como forte em seu relacionamento com o adolescente Michael, mas enfraquecida, envelhecida, simplória no momento de seu julgamento, como se sua simploriedade fosse a prova última, necessária, para que o público a julgasse inocente. Por o diretor não escolhe apresentá-la também em sua força durante o julgamento?

Eu precisava ler o livro para me libertar desta simpatia.

Precisava ler o livro porque me senti, de alguma forma, roubada. Eu precisava saber as razões que levaram o protagonista a se fechar sobre si da forma apresentada no filme e as razões para que ele, subitamente, se apresente, mostre-se. “O leitor”, o filme, padece a falta de um narrador, uma voz que se apresente.

Stephen Daldry fez escolhas que deixaram fora de sua adaptação cinematográfica questões essenciais, estruturais desta história. Stephen Daldry precisaria da voz de um narrador porque esta história é, essencialmente, a história de um esquecimento, a história de uma memória insuportável de tal forma que o sujeito se exercita no esquecimento.

Em vários momentos do livro, nos diz seu narrador (Michael): “Não me lembro mais como cumprimentei a Sra. Schmitz”; “Também não me lembro mais do que conversamos no cozinha”, “Não me lembro mais o que disse a meus pais”, “Embora não tenha nenhuma lembrança das mentiras que contei”, “Tenho na lembrança os últimos na escola e os primeiros na universidade como anos felizes. Ainda assim, mal posso falar sobre eles”, “Talvez por isso o rol de lembranças seja tão pequeno”, “Não sei mais o que ele queria revisar, confirmar ou contestar”, “Não tenho nenhuma lembrança das sessões do seminário às sextas-feiras”, “Comecei a procurar nos depósitos da memória”...


“O Leitor” é a história de um homem que não suporta a lembrança. Que vê a relação que manteve com uma mulher de 36 anos, quando ele tinha 15, com vergonha de sua fragilidade, submissão e entrega diante desta mulher e que faz tudo para esquecê-la: esquecer a mulher, esquecer que era ele este rapaz, esquecer esta relação, fazer seus atos do presente – a arrogância, o distanciamento, a clausura em si mesmo – negar o passado, contradizer o passado até que ele deixe de existir e ele pare de lembrar.

14.2.09

Ainda sobre a escrita, ainda sobre a leitura...

"A garantia de que a história escrita é a certa está no fato de eu tê-la escrito e de não ter escrito as outras versões. A versão escrita quis ser escrita, as muitas outras não o quiseram.

Primeiro quis escrever nossa história para livrar-me dela. Mas para esse objetivo as lembranças não vieram. Então notei como a nossa história estava escapando de mim e quis recolhê-la de novo por meio do trabalho de escrever, mas isso também não destravou as memórias. Há alguns anos deixo nossa história em paz. Fiz as pazes com ela. E ela retornou, detalhe após detalhe, de uma maneira redonda, fechada e direcionada que já não me deixa triste. Que história triste, pensei durante muito tempo. Não que eu pense agora que ela é feliz. Mas penso que é verdadeira e, diante disso, perguntar se é triste ou feliz é algo que não faz sentido.

De todo modo, é o que penso quando acontece de pensar nela. Entreatanto, quando sou magoado, as mágoas experimentadas naquela época vêm à tona, quando me sinto culpado é o sentimento de culpa de então que vêm à tona, e na saudade e na nostalgia atuais experimento a saudade e a nostalgia sentidas naquela época. As camadas tectônicas de nossa vida descansam tão apertadas umas as outras, que sempre encontramos o fato interior no posterior, não como algo completo e realizado, mas como algo presente e vivo. Entendo isso. Todavia às vezes acho difícil de suportar. Talvez eu tenha escrito a nossa história porque queria mesmo me ver livre dela, ainda que isso não seja possível."

"O Leitor", Bernhard Schlink

13.2.09

Uma definição de pulsão?...

“Com bastante freqüência no decorrer da minha vida, fiz o que não tinha decidido e deixei de fazer o que tinha decidido. Algo, que nunca saberei, age; “algo”dirige-se à mulher que não quero mais ver, “algo”faz diante dos superiores a observação que me desgraça, “algo”volta a fumar, embora eu tivesse decidido abandonar o cigarro, e desiste de fumar depois que percebo que sou e permanecerei um fumante. Não quero dizer que pensar e decidir não tenham nenhuma influencia sobre a ação. Mas a ação não perfaz simplesmente o que foi pensado e decidido de antemão. Ela tem sua própria fonte e é da mesma forma independente, como meu pensamento é meu pensamento e minha decisão é minha decisão.”

“O leitor”, Bernhard Schlink

11.2.09

Descoberta

http://p.php.uol.com.br/tropico/html/index.shl

Destaque para o texto de Wladimir Safatle sobre a "estratégia de defesa" de Israel.